O filme Que horas ela volta? e os acontecimentos da cidade dos últimos 20 dias aguçaram a leitura da biografia de Antônio Frederico Castro Alves, muito bem escrita por Alberto da Costa e Silva.
Não consigo tirar da cabeça duas
personalidades que foram tão significativas na infância de Castro Alves. Antônio
José Alves, seu pai. Médico que cuidava dos escravos sem cobrar, dono de uma
biblioteca considerada excelente, que além de gostar de desenhar, ajudou a
conceber grande parte da vida cultural de Salvador. Abílio César Borges, seu
professor. Introduziu novas ideias pedagógicas, misturando matérias, abolindo a
palmatória e fundando os saraus literários, com participação de professores,
pais e alunos.
Acredito que tenha sido a
formação um dos pilares que fez com que Castro Alves soubesse enxergar além do
que os escravos representavam para aquela sociedade. Ele os humanizou. E com
essa sensibilidade, nadas mais ousado que querer mudar o mundo. “O rapaz sabia
o que fazia: não escrevera aqueles versos para serem lidos em silêncio, mas
para serem recitados para a multidão. ”
Jéssica a personagem do filme é
uma jovem que diferentemente de sua mãe, empregada doméstica, teve oportunidade
de estudar e coragem para seguir outro caminho. Saiu do nordeste do país para
balançar os modelos ainda existentes no nosso país. Passou no vestibular e
melhor do que tudo, fez sua mãe refletir sobre a própria vida.
Mas sobre o que Jéssica
escreveria em seus poemas?
Ouso dizer que os jovens negros
do 474 são diferentes de outros jovens negros do passado, eles querem viver sua
juventude, sua falta de lazer no subúrbio, sua falta de oportunidade, sua falta
de estudo. Eles não tem medo dos branquelos playboys da Zona Sul e nem da PM. Eles
não tem nada a perder.
Mas sobre o que eles escreveriam
em seus poemas?
Castro Alves é jovem tanto quanto
eles. Um jovem que teve oportunidade e soube usá-la de forma a contribuir para
a sociedade. Castro Alves escreveu de amor, de natureza, mas ficou mesmo
conhecido como o poeta dos escravos.
Naquele tempo, que inveja minha,
o teatro e os poemas eram armas contra a política. E hoje? Que ferramentas
Castro Alves usaria? O que ele escreveria?
Peço permissão aos poetas de
nosso grupo para escrever meu primeiro poema:
Ontem e Hoje
Lendo Castro Alves ou lendo DaMatta
Negros escravizados ou jovens negros esquecidos
Vejo tudo igual na cidade que habito
Ouvindo a rádio Tupi ou ouvindo rádio Jovem Pan
Tuberculose mata um ou tuberculose mata cinco
Vejo tudo igual no Estado que habito
Vendo TV Manchete ou vendo TV a Cabo
Oligárquicas aumentando a riqueza ou Banqueiros ficando mais
ricos
Vejo tudo igual no país que habito
Notícias trazidas de navio ou internet que acesso todo dia
Imigrantes sendo baleados ou imigrantes sendo afundados
Vejo tudo igual no planeta que habito
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