domingo, 6 de março de 2016





O livro Como Conversar com Fascistas – Reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro, da Marcia Tiburi, é ao mesmo tempo simples e complexo por tratar em poucas páginas tantos temas que dariam para escrever livros. Antes de começar a lê-lo, numa ansiedade pelo título, achei que fosse encontrar nas páginas que se seguiam a reposta da pergunta que me faço toda vez que me vejo em situações onde o outro (que obviamente considero fascista) me incomoda. Essa ansiedade foi se acalmando e mudando de lugar, página a página, quando ainda nos primeiros capítulos passei a indagar: por que o outro é que é o fascista e não eu?

Entendi que uma das propostas (principal) da autora é o diálogo e a escuta (um não existe sem o outro), sendo trabalhados na perspectiva de sair do modelo autocentrado, baseado no paradigma eurocêntrico, e em tantos outros que aprendemos a ser desde que nascemos e nos relacionamos.

Entretanto, desafio ao grupo pensar: É só vir alguém que mora na baixada, frequenta a igreja evangélica, tem 7 filhos e vota no Crivela que nossa escuta vai para puta que pariu. Nos colocamos superiores da mesma maneira que o homem branco, hétero, nascido na zona sul, se coloca no direito de ser achar superior, assim como o Carioca com as pessoas do interior, do Brasileiro com o Boliviano, do Inglês com o Brasileiro e por aí, sem fim...

Voltando ao livro, fiquei com um gosto amargo da apresentação do Jean Wyllys, esperava mais dele. Achei superficial. Misturou política quando falou do Movimento Brasil Livre. Se colocou superior quando falou que compaixão pelos analfabetos políticos.

O livro começa tratando de autoritarismo, democracia, capitalismo e ódio. Discordo da autora ao relacionar o sentimento de ódio e autoritarismo diretamente oriundos do capitalismo, desde que o mundo é mundo, as batalhas sempre foram por poder e território. O modelo econômico pode reforçar, mas não vejo o capitalismo como principal meio do ódio e autoritarismo.

Já a parte que a autora discorre sobre consumismo da linguagem, a influência dos meios de comunicação, principalmente da TV, compartilhando inverdades pelas redes sociais, repetindo discursos sem pensar, sem estudar, é para mim um dos principais dilemas.

Outra palavra que a autora utiliza ao longo do livro e que gostaria de trazer para o debate é alteridade. “O que estamos fazendo uns com os outros? Como fazer para me abrir ao outro? Como fazer para que o outro possa estar aberto à minha própria alteridade? Os atos de fala, nesse caso, precisam ser atos generosos, atos de doação” (página 48). Na página 53, a autora cita Adorno e o texto “Educação após Auschwitz”. E tornei a me perguntar: Como me tornei como eu sou?

Importante quando a autora chama atenção para o modelo de democracia que tanto nos orgulhamos de viver, ao mesmo tempo em que parte da nossa sociedade em geral e a classe política parecem lutar contra os direitos dos outros, não entendendo que isso é questionar seus próprios direitos (anticidadão).  

Na página 70, a autora vincula democracia com alegria. Discordo. Alegria é subjetivo. Assim, apesar de ter entendido a analogia que a autoria quis fazer com a democracia sendo criança e revolucionária, não gostei da comparação. E também não gostei da comparação dos que atualmente batem panela, necessariamente, pessoas que são contra mulheres, homossexuais e etc. No capítulo 27 também discordo da histeria criada para a marcha de 15 de março de 2015.

Outros temas são tratados pela autora como depressão, neofundamentalismo, linchamentos, estupro, legalização do aborto, coronelismo intelectual, a arte de escrever para idiotas e aí quando você achava que ela continuaria a seguir essa linha, ela nos surpreende falando de Brasil.
Foram 6 capítulos tratando do nosso imaginário, de como ele é formado a partir da construção ainda da época de Colombo. O país que nos tornamos e por isso qualquer Brasil natural não existe. Há um Brasil que só cabe nas bibliotecas, provoca na página 156. Critica mais uma vez a educação e os meios de comunicação, pelos quais, carregamos uma bandeira invisível, que só nos torna mais conformados e impotentes.

O livro termina com o caso dos índios Guarani-Kaiowá, onde a autora indica o lado positivo das redes sociais, num momento único e surpreendente, nas palavras dela, sobre a reação da sociedade urbana no apoio aquela causa. Mas eu provocaria a autora exatamente ao contrário. Quantos foram os que leram sobre o que estava acontecendo antes de prestar apoio? Será que as pessoas que fizeram isso realmente se importavam com os índios ou não queriam estar fora daquele movimento e não serem taxadas negativamente?


O livro termina sem mostrar a que veio. Deixa a mensagem do diálogo, trata de assuntos atuais e importantes para o debate, nos provoca questionamentos, mas senti falta de um fechamento melhor.

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