quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Os filhos de Fabiano não têm nome.

Uma história de resistência. No decorrer da leitura, fui assoberbado pelo estilo de Euclides, e achei que esse seria o tom deste comentário. No entanto agora, apenas fechada a última página, o que me vem não é uma crítica ao tom romântico-realista do autor, mas uma tristeza profunda.

Que massacre.

Vidas inúteis, de gente pobre e mestiça. Não houve qualquer insurreição em Canudos. Percebo somente um povo perdido agarrado às ilusões e delírios de um profeta. Passados mais de cem anos, o Conselheiro não teve seu Paulo de Tarso para contar-lhe a história, nem um livro sagrado — tirante massa profícua de cordéis — para propagar seus ensinamentos e façanhas.

Durante os relatos da campanha, todo o tempo me vinham à cabeça os incontáveis massacres semelhantes, dos índios, das missões, do Paraguai, dos pretos, pobres, desempregados, das favelas removidas até hoje, para ficarmos no Brasil. Gaza acontece todos os dias. E das favelas não removidas, que vivem em permanente estado de sítio, com suspensão de liberdades individuais, oportunidades e direitos.


Forças desproporcionais são usadas para reprimir e assassinar pessoas pobres de tudo, que não têm como sair dessa situação, e ainda são culpadas por isso. Toda a sociedade é induzida a considera-los os vilões, responsáveis pela própria ruína e também a de todo o país. São ameaças à República.

Fiquei com vontade de conhecer o sertão. De ter contato com essa gente, que vive num lugar onde, como tantos no mundo, nenhum ser humano deve viver. 

Quando fechei o livro, me veio uma tristeza de dentro, profunda. Senti algo parecido assim quando houve o terremoto no Haiti, a última guerra contra Gaza, as enchentes de 2011 em Petrópolis, quando vi meu povo embaixo d'água. 

Existem categorias de seres humanos. Poucos são aqueles cuja vida tem qualquer valor. Os meninos, os filhos de Fabiano não têm nome. A construção cultural de que os homens são todos iguais é recentíssima, mal tem 300 anos. Penso nisso toda vez que vejo um homem virando o pescoço quando uma mulher passa, fazendo um comentário machista. O bordão de muitos movimentos sociais, que começa com "a nossa luta é todo dia..." é absolutamente verdadeira. Essa igualdade não é dada. É conquistada em uma argamassa de sangue, terra, e ossos todos os dias, com avanços e recuos.

Para evitar a desesperança irrestrita, repito um mantra todos os dias: o mundo está uma merda, mas já foi muito pior. 

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